Adoção de medidas
Se não conseguir reverter tarifaço dos EUA, Brasil tem opção de retaliar com quebra de patentes
Adoção de medida não é consenso no governo; para Croplife, iniciativa poderia causar impactos sistêmicos na cadeia de suprimentos
Rural | 28 de Julho de 2025 as 08h 06min
Fonte: Globo Rural

Se não conseguir avançar na próxima semana com negociações para reverter ou ao menos adiar o tarifaço dos Estados Unidos, o Brasil tem a opção de retaliar os americanos com a quebra de patentes de propriedade intelectual, algo que enfrenta resistência do setor privado em geral. A medida, se implementada, poderia afetar a área de biotecnologia, com impactos no setor de sementes e de defensivos agrícolas, com forte participação de empresas americanas no mercado brasileiro.
A adoção da iniciativa, autorizada pela Lei de Reciprocidade Econômica, não é consenso entre membros do alto escalão do governo, apurou a reportagem. Nos bastidores, no entanto, ministros que acompanham as tratativas do Executivo dizem que o uso da prerrogativa não está de todo descartado.
Isso porque seria a “única” alternativa capaz de gerar “medo” ou causar impacto no governo de Donald Trump para tentar uma negociação em torno das tarifas. O setor produtivo pediu ao governo para que retaliações e medidas de reciprocidade apenas sejam utilizadas em “último caso”, após esgotar todas as possibilidades de articulação com os americanos.
“A eventual quebra de patentes de tecnologias como ação de retaliação brasileira, pode, nos médio e longo prazos, acarretar impactos sistêmicos na cadeia de suprimentos, prejudicar o acesso dos produtores brasileiros a soluções modernas e sustentáveis e enfraquecer a posição do país como líder em produtividade agrícola”, afirmou, em nota ao Valor, a CropLife Brasil, que representa empresas de sementes e defensivos.
A entidade ressaltou que a “quebra de confiança” na lei de patentes pode comprometer investimentos em pesquisa e acarretar prejuízos à agricultura brasileira. “Na Argentina, por exemplo, onde não ocorre o pagamento de direitos de propriedade intelectual nas sementes salvas por parte dos produtores, a produtividade da soja é 30% menor do que no Brasil e nos EUA, dada a falta de estímulo à inovação e ao melhoramento genético no país”, citou, na nota.
A CropLife defendeu mais diálogo e negociação, sem retaliação por parte do Palácio do Planalto. Uma eventual tarifação recíproca pode implicar o aumento dos preços de defensivos agrícolas vindos dos EUA — que respondem por US$ 1,4 bilhão por ano ou 14% do valor importado pelos produtores brasileiros atualmente — e incrementos nos custos de produção aos agricultores brasileiros e na inflação dos alimentos internamente, disse a entidade na nota ao Valor.
Um integrante da Esplanada ponderou que a questão de patentes envolve uma série de compromissos e pode gerar instabilidade jurídica. O objetivo no momento, disse, não é o confronto direto, e sim a busca por soluções que preservem os interesses do Brasil e não escalem mais a situação.
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A ameaça de suspender o pagamento de direitos de propriedade intelectual funcionou em 2014, quando o Brasil abriu uma disputa na Organização Mundial do Comércio (OMC) contra subsídios que os EUA davam aos produtores de algodão. Na época, a Casa Branca aceitou um acordo para compensar danos financeiros causados aos cotonicultores brasileiros e não houve suspensão das patentes.
“É uma ameaça que será apresentada em algum momento”, afirmou Welber Barral, ex-secretário de Comércio Exterior e sócio-fundador da BMJ Consultoria. “Está prevista na Lei de Reciprocidade, teoricamente o Brasil pode adotar, mas é uma medida muito extrema, pois pode ter judicialização, ameaça de investimentos no Brasil, tem problema reputacional. Mas é uma ameaça forte e que os Estados Unidos consideraram no caso do algodão”, completou.
A uma semana da entrada em vigor das tarifas de 50% dos Estados Unidos sobre os produtos brasileiros, que pode paralisar as vendas de carne bovina, suco de laranja, café e frutas, por exemplo, a avaliação de empresários dos setores afetados é que o Executivo ainda não conseguiu interlocução direta com os americanos. Não há clareza do que vai acontecer a partir de 1º de agosto.
O setor produtivo quer o adiamento por 90 dias para a entrada em vigor da tarifa de 50% dos EUA, prevista inicialmente para 1º de agosto. “A ação emergencial que todo mundo pediu era uma carta clara e direta aos EUA pedindo um prazo de 90 dias para entrada em vigor das taxas. Esse pedido formal não foi feito e não vemos nada acontecendo, está uma certa estagnação, pois não há interlocutor”, disse Eduardo Lobo, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Pescados (Abipesca).
As contrapartes americanas também enfrentam dificuldades na luta contra as tarifas. Escritórios tradicionais de lobby não conseguem o mesmo acesso de antes à Casa Branca. Empresas importadoras de suco de laranja acionaram a Justiça recentemente, mas o caminho é longo até um desfecho. Apesar de decisões favoráveis em primeira instância na Corte de Comércio Internacional, o governo americano tem recorrido, obtido a suspensão das ordens e postergado o julgamento final.
Outros setores, como o de frigoríficos de carne bovina, enfrentam o dilema de questionar ou não as tarifas, pois foram apoiadores de primeira hora e doadores da eleição de Trump. O ambiente tem ficado cada dia mais complicado para negociações. “Várias delegações estão em Washington para tentar fazer acordos, e o Brasil não está na primeira prioridade”, disse Barral.
Uma das saídas vislumbradas por ele, que é advogado e atua nas negociações em interlocução com escritórios em Washington, é buscar alternativas para que os importadores possam depositar os valores das tarifas, se forem aplicadas a partir de agosto, em juízo enquanto insistem em derrubar a taxação via ações judiciais. Barral ressaltou que ainda há incertezas entre os empresários, pois não houve publicação do ato executivo com detalhes sobre as tarifas e, possivelmente, setores que possam ficar de fora da cobrança.
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